Famílias empresárias e investidoras, juntamente com todas as coisas boas que ter negócios prósperos e patrimônio traz, tem seus desafios. Dentre eles surge a questão da continuidade: como prosperar com harmonia e união por várias gerações familiares? Este artigo não tem a pretensão de trazer todas as respostas, mas mostrar como o desenvolvimento das pessoas com um entendimento amplo e profundo pode ser promissor e alicerce para a continuidade do grupo familiar.

Ao longo dos anos com tantos momentos de escuta e cuidado com as relações familiares, vivemos processos profundos de trocas, amadurecimento, divergências, superações e acordos muito importantes para a Gestão da Sucessão. Nesse caminho auxiliamos pessoas de todas as idades e dos diferentes papéis a construir seu caminho de desenvolvimento seja individual ou coletivo, no contexto de seus grupos familiares. Isto nos oportunizou construir o entendimento do que hoje chamamos de Desenvolvimento 360 – um olhar cuidadoso para cinco eixos de desenvolvimento fundamentais na família empresária:

  • Autoconhecimento e julgamento;
  • Senso de pertencimento e conexão;
  • Apetite pela realização;
  • Relação com o dinheiro;
  • Aprendizado Contínuo.
  1. Autoconhecimento e julgamento

Quanto mais sabemos de nós mesmos, menos projetamos no outro as nossas questões não resolvidas, todos temos! Na família empresária se manifesta através de julgamento, críticas, preconceitos e resistência à mudança. Quando dedicamos toda atenção a quem está falando, buscamos compreender o fato na ótica do outro para então elaborar uma resposta proporcional, construtiva e empática.

Às vezes, o senso de justiça tem premissas erradas: igualdade é diferente de equidade. As pessoas esperam ser tratadas de maneira proporcional, cada um na sua realidade, mas não é possível esperar o mesmo de pessoas diferentes.

Todos esses conceitos, quando não são bem assimilados internamente, fazem com que o contexto das famílias empresárias seja um ambiente propício para conflitos. Visões distorcidas sobre parentes que trabalham nas empresas, expectativas sobre sucessores, confusão entre salário, dividendo e mesada, são fatores do dia a dia que podem ser mitigados com o amadurecimento e desenvolvimento deste eixo, e sua evolução é fundamental para que possamos criar vínculos saudáveis e profícuos.

Para reflexão, deixamos os seguintes questionamentos:

  • Você identifica alguma passagem/experiência em que um julgamento tenha provocado alguma situação desconfortável ou algum conflito?
  • De que forma o autoconhecimento poderia ter ajudado para um desfecho diferente?
  • De que forma podemos ampliar nosso autoconhecimento?
  1. Senso de Pertencimento e Conexão

O estudo de Harvard sobre longevidade e felicidade apontou que o principal fator com efeito relevante no longo prazo é a conexão interpessoal. Maslow já apontava no seu estudo de Hierarquia das Necessidades o pertencimento como sendo o terceiro fator de importância. Conexão e pertencimento andam juntos porque, se você não experimenta a primeira, dificilmente sentirá o segundo.

Elegemos o “Senso de Pertencimento e Conexão” com um dos eixos de desenvolvimento pois o falso sentimento de que a família por si só é um grupo que ficará unido para sempre, é uma ameaça. Sabemos que famílias empresárias são convidadas a todo o momento a enfrentar dilemas e gerir conflitos que ameaçam a sua harmonia e vontade de permanecer como grupo societário e familiar.

O senso de pertencimento e conexão fortalece os vínculos e faz com que as pessoas se sintam parte de algo importante, seja na esfera pessoal, familiar ou profissional.

Para reflexão, sugerimos, mais uma vez, alguns questionamentos:

  • Você identifica na sua família alguma vivência de inclusão x exclusão que tenha gerado uma pauta de discussão?
  • A partir dos variados papéis (membro familiar que não atue nos negócios, quem atua na governança, quem atua na gestão, quem atua na gestão do patrimônio), como colaborar em despertar a conexão com a família?
  • De que forma podemos despertar o senso de pertencimento nas diferentes gerações?
  1. Apetite pela Realização

 A geração de fundadores das grandes empresas que conhecemos, em sua maioria, empreenderam por necessidade. Quando não há alternativa e existe ambição, a ação é o único caminho. E essa é uma característica inerente aos fundadores.

Quem vive na zona de conforto, com recursos a sua disposição e tem diversas opções de escolha, pode sentir a sua sede por realização diminuída, uma vez que pode ser cômodo permanecer onde se está. O desafio é constituir-se como pessoa transformadora, segura e capaz, a partir do seu desejo.

O sentimento de realização também é um pilar de felicidade e motivação. E no contexto das famílias empresárias a continuidade dos negócios e a preservação de patrimônio demandam que o ímpeto do trabalho esteja sempre presente.

Portanto, desenvolver o “Apetite pela Realização” é um desafio tanto para que as novas gerações sejam felizes, como para que o legado seja bem cuidado e preservado.

Pontos de reflexão:

  • O que ajuda e o que atrapalha um membro familiar a sair da zona de conforto e ir em busca de seus sonhos e realizações?
  • Durante seu processo de desenvolvimento, houve estímulos ao cumprimento de prazos e metas? Em caso afirmativo, houve recompensas para os objetivos atingidos? Isso ajudou?
  • De que forma podemos estimular o apetite pela realização nas diferentes gerações?
  1. Relação com o dinheiro

Diversos fatores tornam a relação com o dinheiro delicada. A riqueza por si só é um estigma no Brasil. Por questões culturais, sociais e políticas criaram-se rótulos onde o rico é apontado pejorativamente como privilegiado.  Quem construiu ou acompanhou de perto a construção de um patrimônio muitas vezes tem mais facilidade de lidar com isso pois conhece o sacrifício e, portanto, o mérito de tê-lo conquistado.

Outro ponto é que o dinheiro, sendo moeda de troca, estabelece símbolos de poder, compensações, autoafirmação e empoderamento. Portanto as relações humanas acabam tendo o dinheiro como combustível para inflamar as diferenças ou, às vezes, como solução paliativa para diminuí-las. Nessa relação se estabelece o dinheiro e a paixão, o dinheiro e o valor e o dinheiro e o resultado.

A fundamental inteligência financeira é uma habilidade que pode ser desenvolvida com treino, estudo e com boa instrução. O fato é que este assunto é inerente às relações pessoais, societárias e profissionais na família empresária, portanto, consideramos outro eixo fundamental de desenvolvimento. Ser desenvolvido neste aspecto protege as relações, a empresa e a longevidade do patrimônio.

Pontos de reflexão:

  • Você concorda com o conceito de que o dinheiro é uma moeda de troca? Sendo assim, de que forma esse conceito influência nas relações das famílias empresárias?
  • Quais impactos a falta de inteligência financeira pode causar nos negócios da Família?
  • De que maneiras podemos desenvolver a inteligência financeira na família empresária?
  1. Aprendizado contínuo

O aprendizado ao longo da vida pressupõe que nunca é cedo ou tarde demais para aprender algo novo – e essa mentalidade está alinhada tanto às demandas corporativas como ao contexto pessoal – quando o mundo contemporâneo, a fragilidade, a não linearidade e as incertezas nos convocam a pensar, repensar, aprender e ressignificar.

A cada nova etapa nos vemos despreparados para o que está por vir. É assim quando temos filhos, quando assumimos novos compromissos nos negócios das nossas famílias e então buscamos aprender e nos desenvolver para dar conta de tais desafios.

No entanto, após a realização de grandes obras, dos sonhos idealizados na juventude e da construção de uma família já independente, parece que o ciclo de desafios e aprendizados chega ao fim. Porém, a ciência mostra que a aprendizagem é também uma questão de saúde e fundamental para a felicidade, pois enquanto estamos aprendendo, estamos motivados e vivos. Essa é uma reflexão importante para nós, nossos pais e avós: dada a saúde e longevidade que se alcança hoje em dia, pensar em novos projetos e manter a curiosidade ativa são fatores importantes para a realização pessoal.

Na família empresária, esse eixo de desenvolvimento é o fio condutor da passagem, onde o experiente ensina sua vivência e o novo ressignifica a aprendizagem, honrando a ancestralidade como forma de transmissão de conhecimento.

Pontos de reflexão:

  • “Na família empresária, esse eixo de desenvolvimento é o fio condutor da passagem, onde o experiente ensina sua vivência e o novo ressignifica a aprendizagem, honrando a ancestralidade como forma de transmissão de conhecimento.” Qual a opinião de vocês sobre esta afirmação?
  • De que forma as famílias empresárias podem estimular e desenvolver o aprendizado nas diferentes gerações?

Portanto, o Desenvolvimento 360 propõe um olhar amplo e contínuo para estas variáveis inerentes a família empresária. Buscar refletir e se aprofundar em cada um dos eixos faz com que tenhamos uma melhor leitura sobre os fatos e desafios que se apresentam. Assim, torna-se possivel nos desenvolvermos com mais consistência em aspectos técnicos e comportamentais demandados para nossa atuação, seja ela qual for.

Este foi o tema do 14º Painel do Instituto Sucessor. O evento contou com a participação de um ilustrador gráfico que à medida em que as palestras, discussões e conversas iam acontecendo, as principais ideias iam sendo registrados em um único documento. Deixamos aqui então esse registro.

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